apêndices
queratinizados filiformes e coniformes da pele dos mamíferos.
os pelos.
acusaram a sujeira do velho e a prefeitura veio.
não habitua vir. mas dessa vez
veio.
vi a kombi oficial chegar.
vi bolsas de pele escura despencando. peitos muxibas
explícitas.
camadas e mais camadas de couro morto. capa apodrecida.
a crosta
de nojeira que cobria o velho mendigo praticamente fóssil. vi.
só eu intuía naquele instante de dejetos em que esgotos,
em que fumos eu próprio sufocava,
só eu intuía que voragem de lodo me
induzia vacilar, “é a minha febre” eu falei ainda num fumo
mais escuro, fatigado de conceitos dormidos, narizes
carinhosos,
macios malabarismos, que tudo fosse congelado,
minhas mãos, as presas da minha boca, as cascas que
me velavam o tronco do corpo, minha orelha, meus
cílios, contanto que ao mesmo espaço me fosse
mantida a garganta imprestável.
como eliminar uma dor de garganta a sussurros.
comprimidos, seringas em flamas,
médicos se debatendo,
a janela me flama,
o objeto talhado em vômito
nas calçadas das biroscas
e dos lupanares,
as músicas incompreensíveis
e o neon sempre colorido dos letreiros.
escamas como de um réptil os dedos das mãos e dos pés.
flocos de baba pelos pelos da cara, congelados por
essa neve.
meditei a frigidez daquela aparência conduzi tentei
minha atenção para outros lugares
vago com prudência pra não doer em mim
mesmo, porque se alastra a dor não posso
ter um controle de dividir o que é ele
o que sou eu, só sinto aquela perda de
temperatura me invadir assim
indiscernivelmente, com terror, após
mínima observação, mínimo sentir.
controlo a paúra que o corpo do velho comunica
tomo meus remédios, eu tomei os meus
remédios hoje, logo cedo, porque sei
que o dia começa fogo, ele pancadeia cedo,
não aguarda você estar pronto, nem sequer estou
em guarda e já vem, lá vem de novo, direito de
me preparar? que nada, desleal, desleal até não poder mais,
até arrancar as minhas cutículas e dilatar as minhas pupilas,
até me levar ao psicanalista, me fazer, obrigar, a dizer
em carreirinha minhas angústias.
poderia reclamar das rótulas dos joelhos gastas, das cataratas recobrindo o mundo,
dos pés roxos de diabetes, da hérnia saltando pra fora
do pé da barriga.
mas permanecia mudo.
o agente do serviço social ou enfermeiro molhava
o chumaço de algodão no pote, cheio de uma substância
que poderia ser soro
fisiológico, água boricada ou simples água. coisa com poder de
limpar.
na calçada de um buteco. eu vi.
as mãos do moço tinham o maior cuidado ao contatar
o revestimento frágil do rosto. as lâminas de
remela
lentamente se soltavam dos olhos apagados.
ressecamento do líquido que compõe a lágrima. fusão de
gordura
e sujeira. assisti o constrangimento ao limpar o pênis caído, embasado pelo escroto bem murcho.
vontade de falar: “e o fiofó, meu filho? também tá sujo”
vergonha.
mas o rapaz havia de lembrar.
pele negra folheada a cinzas. bagaços pela finura do
pescoço. assisti.
mais tarde a lágrima do agente/enfermeiro também poderia se
coagular
em remela. anuviado, ele retirava películas dos
ombros arqueados.
membranas
dos cambitos pernas e braços. lascas de
cera
do ouvido de gigantescas orelhas.
o velhinho quase nada dizia, só raras vezes:
tô abandonado de Deus… tô abandonado de Deus…
aquele resíduo de velho, encontrei talvez fragmentado
na sola de um sapato, inconveniente feito chiclete
agarrado do chão. resquício insistente em minha
luz dos sentidos queria prescindir não me
envolver deixar ir. por que ter que participar?
lume sobre uma situação incômoda esperei por
sombra, algum encobrimento da realidade
um entorpecente que diminuísse minha lucidez
que embriagasse bem-vindo, que me movesse
para insensibilidade. queria poder não saber,
tomar nenhum conhecimento.
consideremos por hora a sobra dos resultados dos lucros.
eles são idênticos uns aos outros: dinheiro.
sem exceção, têm uma só natureza mágica, impalpável.
transfigurados em requintados gêmeos, parcelas do mesmo labor comum, todos estes entes revelam o mesmo: que na sua confecção
foi desprendida uma tração de esforço sapiens, que neles
está contido labor sapiens.
na qualidade de congelados dessa matéria antropológica comunitária, são reconhecidas riquezas.
hesitou o representante do
estado
diante da impenetrabilidade de cabelo e barba, que por
trás de tudo, deveriam ser completamente
brancos. dali com certeza tiraria retalhos de
sebo. eu vi.
da flacidez das dobras da barriga saiu invólucro.
esfoliação meandrosa, labiríntica. mapa cerrado.
muito silêncio daqueles
lábios
fendidos, em carneviva erupção vulcânica. de pus. lava.
do deixado por Deus. vi.
apêndices
queratinizados filiformes e coniformes da pele dos mamíferos.
os pelos.
acusaram a sujeira do velho e a prefeitura veio.
não habitua vir. mas dessa vez
veio.
vi a kombi oficial chegar.
vi bolsas de pele escura despencando. peitos muxibas
explícitas.
camadas e mais camadas de couro morto. capa apodrecida.
a crosta
de nojeira que cobria o velho mendigo praticamente fóssil. vi.
só eu intuía naquele instante de dejetos em que esgotos,
em que fumos eu próprio sufocava,
só eu intuía que voragem de lodo me
induzia vacilar, “é a minha febre” eu falei ainda num fumo
mais escuro, fatigado de conceitos dormidos, narizes
carinhosos,
macios malabarismos, que tudo fosse congelado,
minhas mãos, as presas da minha boca, as cascas que
me velavam o tronco do corpo, minha orelha, meus
cílios, contanto que ao mesmo espaço me fosse
mantida a garganta imprestável.
como eliminar uma dor de garganta a sussurros.
comprimidos, seringas em flamas,
médicos se debatendo,
a janela me flama,
o objeto talhado em vômito
nas calçadas das biroscas
e dos lupanares,
as músicas incompreensíveis
e o neon sempre colorido dos letreiros.
escamas como de um réptil os dedos das mãos e dos pés.
flocos de baba pelos pelos da cara, congelados por
essa neve.
meditei a frigidez daquela aparência conduzi tentei
minha atenção para outros lugares
vago com prudência pra não doer em mim
mesmo, porque se alastra a dor não posso
ter um controle de dividir o que é ele
o que sou eu, só sinto aquela perda de
temperatura me invadir assim
indiscernivelmente, com terror, após
mínima observação, mínimo sentir.
controlo a paúra que o corpo do velho comunica
tomo meus remédios, eu tomei os meus
remédios hoje, logo cedo, porque sei
que o dia começa fogo, ele pancadeia cedo,
não aguarda você estar pronto, nem sequer estou
em guarda e já vem, lá vem de novo, direito de
me preparar? que nada, desleal, desleal até não poder mais,
até arrancar as minhas cutículas e dilatar as minhas pupilas,
até me levar ao psicanalista, me fazer, obrigar, a dizer
em carreirinha minhas angústias.
poderia reclamar das rótulas dos joelhos gastas, das cataratas recobrindo o mundo,
dos pés roxos de diabetes, da hérnia saltando pra fora
do pé da barriga.
mas permanecia mudo.
o agente do serviço social ou enfermeiro molhava
o chumaço de algodão no pote, cheio de uma substância
que poderia ser soro
fisiológico, água boricada ou simples água. coisa com poder de
limpar.
na calçada de um buteco. eu vi.
as mãos do moço tinham o maior cuidado ao contatar
o revestimento frágil do rosto. as lâminas de
remela
lentamente se soltavam dos olhos apagados.
ressecamento do líquido que compõe a lágrima. fusão de
gordura
e sujeira. assisti o constrangimento ao limpar o pênis caído, embasado pelo escroto bem murcho.
vontade de falar: “e o fiofó, meu filho? também tá sujo”
vergonha.
mas o rapaz havia de lembrar.
pele negra folheada a cinzas. bagaços pela finura do
pescoço. assisti.
mais tarde a lágrima do agente/enfermeiro também poderia se
coagular
em remela. anuviado, ele retirava películas dos
ombros arqueados.
membranas
dos cambitos pernas e braços. lascas de
cera
do ouvido de gigantescas orelhas.
o velhinho quase nada dizia, só raras vezes:
tô abandonado de Deus… tô abandonado de Deus…
aquele resíduo de velho, encontrei talvez fragmentado
na sola de um sapato, inconveniente feito chiclete
agarrado do chão. resquício insistente em minha
luz dos sentidos queria prescindir não me
envolver deixar ir. por que ter que participar?
lume sobre uma situação incômoda esperei por
sombra, algum encobrimento da realidade
um entorpecente que diminuísse minha lucidez
que embriagasse bem-vindo, que me movesse
para insensibilidade. queria poder não saber,
tomar nenhum conhecimento.
consideremos por hora a sobra dos resultados dos lucros.
eles são idênticos uns aos outros: dinheiro.
sem exceção, têm uma só natureza mágica, impalpável.
transfigurados em requintados gêmeos, parcelas do mesmo labor comum, todos estes entes revelam o mesmo: que na sua confecção
foi desprendida uma tração de esforço sapiens, que neles
está contido labor sapiens.
na qualidade de congelados dessa matéria antropológica comunitária, são reconhecidas riquezas.
hesitou o representante do
estado
diante da impenetrabilidade de cabelo e barba, que por
trás de tudo, deveriam ser completamente
brancos. dali com certeza tiraria retalhos de
sebo. eu vi.
da flacidez das dobras da barriga saiu invólucro.
esfoliação meandrosa, labiríntica. mapa cerrado.
muito silêncio daqueles
lábios
fendidos, em carneviva erupção vulcânica. de pus. lava.
do deixado por Deus. vi.